FONTE E REDAÇÃO: Sérgio Henrique Santos, especial para o Diário de Natal
Numa
cidade cuja principal atividade econômica é o turismo e que vai sediar
jogos da Copa do Mundo, é preciso garantir uma infraestrutura mínima de
segurança para oferecer tranquilidade aos brasileiros e estrangeiros que
desembarcam no Aeroporto Internacional Augusto Severo ou no Terminal
Rodoviário Severino Tomaz da Silveira e que se hospedam em busca de
lazer e diversão em Natal e adjacências. Só que se a Copa fosse hoje,
tanto o policiamento ostensivo, feito pela Polícia Militar, quanto o
investigativo, realizado pela Polícia Civil, deixam a desejar no quesito
assistência ao turista. Isso porque vários fatores dificultam o
trabalho dos policiais e agentes, tais como infraestrutura, pouco
efetivo e falta de incentivo à capacitação, como os cursos de idiomas,
imprescindíveis para quem lida com turistas estrangeiros.
A
demanda é alta. Segundo a Secretaria Estadual de Turismo (Setur), cerca
de 2 milhões de turistas visitam Natal a cada ano. Desse total, 30% são
estrangeiros, a maior parte portugueses. Contudo, com a justificativa de
que quase não há ocorrências envolvendo turistas, pouco se investe
nessa polícia especializada. Para toda essa demanda atual, apenas 130
policiais atuam entre Genipabu e Ponta Negra, área de circunscrição da
Companhia Independente de Policiamento Turístico (Cptur).
Criada
em abril de 2010 para agir preventivamente como órgão de apoio às ações
de policiamento, a Cptur atua em áreas de especial interesse turístico e
na preservação do patrimônio turístico da Região Metropolitana de
Natal. No caso da Delegacia Especializada de Atendimento ao Turista
(Deatur), que age em toda ocorrência policial onde a vítima é um
turista, apenas 14 pessoas são responsáveis pelas investigações em todo o
Estado, incluindo-se nessa cota a delegada responsável, os chefes de
cartório e de investigação e os onze agentes.
Se a Copa trouxer
na bagagem mais turistas, é preciso no mínimo um reforço para atender
esse público. Atualmente apenas 38 policiais fazempatrulhamento diário
dentro das sete viaturas, e mais dez nos postos fixos existentes na
orla. "Até o meio do ano estaremos instalados na Via Costeira, o que vai
facilitar o nosso trabalho. Além disso, existe a questão do efetivo,
sempre necessário. Quanto mais policiais nas ruas melhor para a
população. Outra questão são as diárias operacionais, necessárias para
os nossos homens que atuam na alta estação", diz o major Marlon de Góis
Bay, que comanda a companhia independente.
Inciativa privada por ser aliada
A
obra da nova sede da companhia, que fica no antigo Grupamento do Corpo
de Bombeiros, no centro da Via Costeira, está caminhando. Mas é preciso
agilizá-la. No momento em que a reportagem do DN estava na atual sede da
Ciptur, no Quartel do Comando Geral, no Tirol, sacos de cimento
aguardavam ser levados às obras e alguns veículos passavam por
manutenção. "Estamos tocando a obra com o pouco que temos. Talvez com
uma parceria com a iniciativa privada, quem sabe os donos de hotéis ou a
ABIH [Associação Brasileira da Indústria de Hotéis] pudessem doar
material para a reforma da nossa sede. Se a iniciativa privada se aliar
com a Polícia Militar as coisas vão andar com mais velocidade", afirma
Marlon de Góis.
Enquanto os investimentos públicos (nem os
privados) não vêm, é preciso trabalhar com as condições atuais. A maior
parte das ocorrências do policiamento turístico se refere a pequenos
roubos e furtos. "São raras as ocorrências com turistas aqui em Natal.
Tem dias que não registramos nenhuma. A maioria procura os policiais
para pedir informações e orientações com relação às praias. Claro que
não trabalhamos sós. Contamos com apoio de unidades como a Rocam
[motocicletas], cavalaria ou com os companheiros do 1º BPM [Rocas]", diz
o major. Outro tipo de ocorrência relativamente comum são as tentativas
de suicídio na Ponte Newton Navarro. "Conseguimos impedir 90% dos
saltos que poderiam haver ali".
Hoje existem sete viaturas
percorrendo diariamente o trecho de competência da Cptur, e quatro
postos fixos situados em locais como a entrada da Via Costeira, as
imediações da Ponta do Morcego (Praia dos Artistas), a Praça da Jangada
(Praia do Meio), e o Forte dos Reis Magos. Além disso, há instalações da
Ciptur no Centro de Turismo, em Petrópolis, e está sendo construída a
nova sede da companhia. Somadas às viaturas do comando e subcomando, dez
carros são responsáveis pelo policiamento turístico. A Ciptur também
conta com oito bicicletas para ciclopatrulhamento nas praias e dois
quadriciclos, normalmente usados na alta estação, quando há um reforço
do efetivo.
Inglês ainda é incipiente
A
Companhia Independente de Policiamento Turístico é um órgão de execução e
unidade operacional de caráter especializado, sendo responsável na
atuação preventiva contra crimes envolvendo turistas. Ela atua na
repressão e em caso de violação da lei em áreas de especial interesse
turístico da Região Metropolitana de Natal, além de cooperar com as
atividades das demais Unidades Operacionais da Polícia Militar, com
outros órgãos do Sistema de Segurança Pública e da Defesa Social.
"Nós
temos uma estrutura razoável, com efetivo satisfatório. Apesar de tudo,
acredito que a avenida mais segura do Rio Grande do Norte, que inclui a
orla da área urbana de Natal, entre Santa Rita e a praia de Ponta
Negra, é de nossa competência", argumenta Marlon de Góis, há um ano à
frente da companhia. "Nosso público tanto é o turista quanto o público
local que está nos polos de visitação de forma geral. Nossos policiais
são orientados a lidar com o turista. Orientamos a tratá-los com
cortesia. Como o turista geralmente não conhece a cidade, também é
carente de informação e de atenção de maneira geral".
Para
superar a limitação no quadro de policiais, a companhia toma algumas
estratégias. Durante a alta estação, por exemplo, nenhum policial tira
férias. Todo o efetivo é deslocado para patrulhar os pontos turísticos
da capital e região. "Por enquanto com relação a idioma ainda se exige
muito pouco de nós, mas eu pretendo fazer sim um curso de inglês. O que
ajuda é que geralmente os garçons, guias de excursões, gerentes de
hotéis e motoristas de táxi sabem falar inglês, ou então levamos o
turista à delegacia. Lá eles desenrolam", diz o soldado Wendell Nicolau
dos Santos, que faz trabalho ostensivo e preventivo.
O tenente
Nicolas Neves Beda, que está há dois anos na Companhia, começou um curso
de qualificação no Senac para aprender inglês. Atualmente ele entende a
parte escrita e algumas palavras no idioma estrangeiro. "Quero ter
fluidez no inglês para poder me comunicar melhor com os turistas. Como
basicamente eles buscam informações dos locais, como hotéis, shopping
centers, ônibus e acessos aos pontos turísticos, é importante. E
imprescindível para nossa principal função, que é a de prevenir para que
não aconteçam delitos, conforme determina a Constituição", argumenta
Nicolas, já formado em cooperativismo e cursando a segunda graduação, em
Ciências Contábeis na UFRN.
"Um dos problemas da capacitação é
que, usualmente, o policial que fala inglês normalmente não quer
trabalhar nas ruas, e sim ser promovido, ficar em algum gabinete ou
atuando nos setores administrativos", declarou outro policial, que
preferiu não se identificar. Em 2010 alguns policiais da Ciptur fizeram o
Curso de Capacitação em Turismo, numa parceria entre a Federação das
Indústrias do RN (Fiern), o Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia (IFRN) e a Escola do Governo. Puderam aprender noções de
línguas e dados sobre os principais pontos turísticos de Natal e do Rio
Grande do Norte. "Na formação de novas turmas é designada uma parte do
efetivo para a Ciptur. Nesse curso, por exemplo, eles tiveram uma
oportunidade de se capacitar. Não é critério, por exemplo, falar inglês
ou espanhol para vir pra cá, mas a gente procura policiais que tenham um
perfil adequado a trabalhar com o turista", justifica o comandante
Marlon de Góis.
Atualmente existem dez policiais que fazem cursos
de idiomas pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), de
forma gratuita, dentro do programa desenvolvido pela Secretaria Nacional
de Segurança Pública (Senasp) para a Copa 2014. "Queremos ampliar essa
capacitação. A Senasp já garantiu que vai fornecer cursos de idiomas. A
nossa meta é que 100% dos nossos policiais saibam falar inglês até a
Copa 2014", planeja Góis.
Delegacia é bem localizada, mas acesso deixa a desejar
Se
a Polícia Militar que atende ao turista precisa de melhorias, a Civil
não fica muito atrás. Responsável por atender os turistas que foram
vítimas de algum tipo de crime, a Delegacia Especializada de Atendimento
ao Turista (Deatur) é bem localizada. Funciona em Ponta Negra, dentro
do Praia Shopping, o mais frequentado pelos turistas que procuram Natal.
O problema é que o acesso principal está bloqueado desde que a Central
do Cidadão fechou as portas, e o acesso se dá pelos fundos, numa escada
de alumínio, onde há equipamentos de ar-condicionado, tubulações e
fiação. Um cadeirante seguramente não teria acesso à delegacia.
A
delegacia também divide o mesmo espaço com a Delegacia Especializada de
Proteção ao Meio Ambiente (Deprema). Outro problema é o efetivo. Apenas
14 pessoas atuam na delegacia, incluindo a delegada Alzira Vieira, o
chefe de cartório, o chefe de investigações e os onze agentes. De todo o
efetivo, cinco servidores falam fluentemente outra língua diferente do
português, o idioma oficial do Brasil. Sorte deles que o número de
ocorrências ainda é baixo. No ano passado foram apenas 39 inquéritos
instaurados e remetidos à Justiça. Mas a demanda cresce. Este ano, de
janeiro a abril, já são 21 inquéritos, metade do registrado em todo o
ano passado.
Na Deatur há uma viatura nova e mais duas (uma
caracterizada e outra descaracterizada), coletes à prova de balas para
alguns agentes, armas, munições e equipamentos como impressoras e
computadores. No caso das ocorrências, o mesmo tipo de crime que
caracteriza o perfil que procura a PM chega à civil: pequenos furtos e
roubos. "Acredito que o nosso efetivo é suficiente não porque a demanda
seja pouca, mas para a demanda que se tem a quantidade de policiais que
dispomos é suficiente sim. Tanto para as investigações como para alguns
trabalhos esporádicos que inevitavelmente precisamos fazer", declarou o
escrivão da Deatur, Alexsandro Rocha. Por falta de efetivo na Polícia
Civil, ele já teve que sair de um curso na Academia de Polícia
(Acadepol) para lavrar um flagrante na Deprema, por falta de escrivão na
delegacia vizinha à sua.
Normalmente quem procura a delegacia é o
turista que frequenta lugares ermos, sinuosos, e que talvez por falta
de informação não saiba quais regiões da cidade oferece mais riscos para
ele. "Às vezes eles usam relógios de ouro, máquinas fotográficas
digitais, demonstrando vulnerabilidade, e acabam sendo vítimas desses
bandidos que se aproveitam dos turistas", disse Alexsandro. "Somos a
única delegacia especializada para os turistas no Estado. Atendemos
ocorrências em todo o Rio Grande do Norte. Mas nada impede que um crime
que ocorreu em Mossoró seja investigado pela delegacia local, sempre
contamos com as parcerias".